
Estive pela primeira vez em Londres, já faz muito tempo. Fui pra ficar uma semana, fiquei três meses. Era inverno, foram apenas três dias de sol e meu dinheiro acabou rapidinho. Mas me apaixonei pela cidade. Fiquei hospedado no apê de um casal amigo, no bairro de Notting Hill, e não me esqueço das misteriosamente belas noites frias, das ruas vazias envoltas pelo famoso fog... daquele clima 'Jack the Ripper'. As sessões da meia-noite no Electric Cinema, a generosa cerveja preta servida nos pubs mais tradicionais, os shows de bandas iniciantes no Marquee, a deliciosa decadência da Carnaby Street e a juventude londrina, ao mesmo tempo agressiva e ingênua. Pra garantir a cerveja e o sanduba de cada dia, fui 'lanterninha' em alguns shows de rock na Wembley Arena e vendedor de final de semana na feirinha de Portobello Road. Fiz alguns amigos - brasileiros ilegais morando em casas abandonadas invadidas (onde promoviam festas sensacionais), iranianos traficantes, músicos jamaicanos, estudantes moçambicanos, 'dandys' ingleses. Voltei a Londres cerca de 20 anos depois, e em situação totalmente diferente - como executivo de terno e gravata, pra me hospedar por uma semana em um hotel chique, mas extremamente inglês (nada dessas cadeias americanas), instalado numa mansão vitoriana de frente para um dos lados do Hyde Park. Quando cheguei ao Aeroporto de Heathrow e saí pra pegar um taxi, vivi uma experiência inédita: o CHEIRO de Londres, que eu nem desconfiava que ainda resistia em mim, invadiu-me as narinas e me trouxe de volta todas as emoções que tentei resumir acima. A tal da memória olfativa existe!
Sentimento parecido vivi ontem, ao ler a curta,porém sensibilíssima comparação que Tarsila Riso - que passa temporada por lá - fez entre Londres e Paris. Vejam só:
"... Londres é uma cidade incrivel. Uma coisa e uma região nova para se conhecer a cada dia. Londres é viva e intensa. Paris é perfeita, Londres é real. Tenho a sensação de que aqui, as pessoas vivem; em Paris, elas estão apenas de passagem. Prefiro as coisas tocáveis e as coisas reais. Prefiro respirar o ar frio londrino que o ar blasé francês. Prefiro o humor inglês ao charme francês. Prefiro jardins onde as coisas florescem por elas mesmas, do que jardins montados e simétricos".