segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Tim Maia!!!


Era 1995 e a música brasileira chorava a recente perda de Tom Jobim (em dezembro de 94), enquanto os Mamonas Assassinas dominavam o mainstream do rádio e da TV. Em um apart-hotel dos Jardins, em São Paulo, Tim Maia recebia os jornalistas Marcio Gaspar e Lauro Lisboa Garcia para uma entrevista cujo mote era o lançamento do disco “Nova Era Glacial”. Lauro, repórter do Caderno 2 de O Estado de São Paulo, que publicaria poucos dias depois (assim como o Jornal da Tarde), alguns trechos da conversa; e Marcio, da Qualis, efêmera revista paulista especializada em música, que fecharia suas portas antes da publicação da entrevista.

A maior parte da memorável conversa com Tim Maia, que morreria três anos depois (em 15 de março de 1998), permanecia inédita até agora. A entrevista (quase) completa está no número mais recente da revista 'Brasileiros', que acaba de chegar às bancas. E é possível OUVIR a entrevista NA ÍNTEGRA (com excelentes 'localizações' do Gabriel) no blog http://www.afroencias.com.br. A visita é obrigatória!

Às 9 horas daquela manhã de 1995, encontramos um Tim Maia surpreendentemente bem disposto. E como era de seu feitio, o cantor não mediu as palavras, não se preocupou em poupar esse ou aquele, não fez média. Como se pode conferir, além do imenso talento musical, a autenticidade de Tim Maia era outra de suas melhores qualidades. A seguir, um breve aperitivo.

Existem vários empresários que já armaram pra ganhar dinheiro comigo. Teve um empresário uma vez aqui em São Paulo, em Campinas, que na hora de entrar no palco, ele falou: “Tim Maia, é o seguinte, aí:” – naquela época o show era duzentos, não sei o que era, mas era duzentos – “te dou cenzinho agora e tu volta pro hotel...”. Eu: “Tu tá maluco, cara? São quatro horas da manhã!”. Nesse dia, foram 32 mulheres pro hospital e nós fomos retirados lá do ginásio no tal do Tático Móvel. Pessoal muito educado que vai chegando assim: “filho da puta!” Isso é o mínimo que eles falam, né? Era tudo preto ainda. “Vai, crioulo filho da puta!”. E isso tudo com um cassetete que dá choque. Eles encostam o cassetete na pessoa e “tchen!”. Mas nós fomos retirados desse clube por um tático móvel, às cinco horas da manhã, porque teve uma porrada geral no clube porque o cara armou duzentos e no final queria cenzinho, metade do cachê. Tem uns caras de show aí que são meus amigos até hoje, mas que fizeram um boato que porra... minha mãe ainda era viva, foi mó problema, minha mãe passou mal essa noite. Disseram que eu tava com câncer no cérebro. As pessoas ligavam pra minha casa, uma loucura, até o dia que me mataram mesmo: “Tim Maia morreu”. Falaram pra minha irmã: “A senhora sabia que seu irmão faleceu?”. (Ela): “Meu irmão tá dormindo aqui, doidão!”. Então, tem esses folclores que são uma merda. Porra, é que nem aquele negócio que você tava falando de dar esporro nos músicos. O que os músicos arrumaram de confusão ninguém fala. Essa ação que eles me moveram foi cruel, pô. Achei muito desonesto. E não é negócio de R$ 5 mil. É o que eu tô te falando: eles já me levaram quase R$ 400 mil, cara. Troço pra você comprar três apartamentos. O meu carro é um Monza, cara. Eu poderia estar com um Mitsubishi 446, um BMW, bla bla bla, e tô pagando músico, R$ 100 mil cada um. Esse dos R$ 117 mil foi foda, cara. Sabe o que é o cara te levar R$ 117 mil, cara? Dinheiro que eu economizei minha vida inteira, cara! A minha vida inteira trabalhando, o dinheirinho que eu tinha lá ele levou. É muito difícil falar isso porque é foda, mas no Rio de Janeiro o achaque vem de tudo quanto é lado – não é só assaltante e sequestrador não, sabe?


Muito místico, nosso Brasil é muito místico... o que não é verdade mesmo é tomar ayahuasca e dizer que é Santo Daime – isso aí é mó mentira, viu (risos)? É ayahuasca mesmo, aquilo é mó viagem! Sorvete vira beterraba, helicóptero vira máquina de passar roupa, morou? E dão pra criança. Isso aí, não. Faz um mal tremendo ao fígado! Pior troço que tem pro fígado é a chacrona, que eles chamam de Santo Daime. De Santo, o Daime não tem nada! Chama-se ayahuasca, os índios adoram! Toma aquela porra, fica viajando pra caralho. Aí, isso não tem nada a ver com a realidade, isso aí já é uma coisa totalmente mística mesmo – uma erva que faz você viajar, pensando que aqui tá aqui e aqui não tá, tá lá. E fica aquela confusão do cacete. Eu digo assim, conscientemente, caretinha, sem tomar nada, sem nenhum ritual, sem incenso.


A maconha já tá liberada; a cocaína e a pena de morte também. Isso já tá liberado no Brasil faz tempo. Quer mais maconha do que no Brasil? O Brasil é o maior produtor de maconha do mundo! Ninguém planta mais maconha do que o Brasil. E Pernambuco é o estado onde mais se planta maconha no mundo. E o brasileiro é o maior maconheiro do mundo! Alcoólatra também, por excelência, mas queima um fumo violento! Todo brasileiro queima fumo: vai lá no Norte, puta que o pariu, todo mundo gosta... no Sul, também adoram. Todos, todo mundo! Então acho que é uma demagogia do cacete. Poderia se plantar isso aí e colher bons frutos, uma maconha boa, THC bem forte... o haxixe, por exemplo, é a melhor coisa que tem pra acalmar os ânimos, não faz mal pra ninguém, é bom pra glaucoma. Acho uma estupidez, uma demagogia do cacete, proibir fumo, entendeu? O fumo é uma planta, uma coisa natural... eu fui intimado duas vezes nessa semana, pra ir na polícia. Eu não vou em lugar nenhum. Tem um cara lá que foi preso, deram porrada no cara pra ele dizer que trazia haxixe pra mim. Daí, em juízo, o cara falou que não era nada disso, que levou porrada na delegacia, na 27ª, lá em Brás de Pina, no Rio de Janeiro. Daí, fui intimado e mandei meus advogados lá...volta e meia tentam me envolver nessas porras aí, cara, e por causa de haxixe. Ainda se fosse cocaína, heroína... mas haxixe? É uma estupidez. THC... cannabis... proibir a cannabis e liberar o álcool é a maior loucura, uma coisa porca, suja, imunda, mentirosa! Porque o álcool destrói o ser humano em poucos anos, em meses. Se você beber mesmo, o teu figueiredo não agüenta. Eu mesmo, não posso beber mais. E olha que eu não bebia muito, hein? Eu só bebia quando fazia show e quando andava de avião.

21 comentários:

anna disse...

sem nenhum freio!

Anônimo disse...

ótimo!
rolou um "Garrastazu" no apat-hotel?
parangolé

Gabriel Rocha Gaspar disse...

Legal! Mas no Afro não estão só trechos, é a íntegra da entrevista! Abraços e parabéns

Neil Son disse...

faz falta um cara como esse, né anna?

Neil Son disse...

hehehe paranga, 'detalhes sórdidos' ficam para a imaginação de cada um...

Neil Son disse...

já corrigi aí no post, gabriel!

Lord Broken Pottery disse...

Excelente revista a Brasileiros, não?
Grande abraço

peri s.c. disse...

Grande Tim, nos dois sentidos.
Faz falta no palco e fora dele.

Anônimo disse...

imagino, no mínimo, dois bauretes e tres lite moça...
parangolé

franka disse...

parabéns, super matéria essa da gasparlândia, falei dela na frankolândia.

Tiago Ferreira da Silva disse...

Márcio,
Parabéns pelo trabalho realizado. Vi somente no site alguns trechos e me rachei (muito mesmo) com a irreverência e o jeitão simples do Tim Maia.

Poatz, aquela comparação do advogado, pedreiro e músico é fOda!!!

Mas confesso que gostei mais do material em áudio mesmo. Me senti dentro da conversa!!!
Muito loko!

Abraço!!!

Neil Son disse...

lord: a revista é boa, mas às vezes revela um ranço esquerdista totalmente ultrapassado...

Neil Son disse...

peri: no palco, muitas vezes ele fez falta, mesmo ainda vivo hehehe...

Neil Son disse...

que isso paranga, ele tava na fase 'saúde', hahaha!

Neil Son disse...

franka: tá precisando de um síndico aí na frankalandia!

Neil Son disse...

é tiago, em audio não tem comparação. aliás esse post é mais da série dos 'não-posts'. trata-se apenas de uma chamada para o afroências e para a brasileiros. e agradeço os parabéns!

Anônimo disse...
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Sibila disse...

Neil,
vim pra desejar um ano-novo suingado, travesso, bem-humorado, inteligentão, feliz e amoroso e mais tantas da boa que nosso Tim Maia nos legou.
Beijão.

Lord Broken Pottery disse...

Volto pra dizer que li a reportagem inteira na revista. Muito boa! Você reparou que você e o Jayme estão no mesmo número?
Grande abraço

Neil Son disse...

tudibão pra vc tambem, sibila!

Neil Son disse...

lord: foi o amigo jayme que 'fez a ponte' entre eu e o helio campos mello, editor da revista.