
Fui ontem ver o show do Djavan no HSBC Brasil (ex-Tom Brasil). A princípio, achei meio estranho: uma única apresentação na cidade, numa segunda-feira, e salvo engano, pessimamamente divulgada. Mas... surpresa: a ampla sala de espetáculos estava completamente lotada! Tal fato serve de mote pra falar da inusitada posição ocupada pelo cantor e compositor alagoano na música brasileira (prometi a mim mesmo jamais escrever novamente o depreciado e surrado termo ‘MPB’). Pouca gente deve se lembrar, mas Djavan despontou como um original sambista, na metade da década de 70, com as excelentes ‘Fato Consumado’ e ‘Flor de Lis’. Representou, sem dúvida, um sopro de novidade: suingue bem próprio, voz marcante, cara de menino. Mas ele já tinha estrada: antes de vir pro Sul Maravilha, em 73, Djavan Caetano Viana era, ao mesmo tempo, meio-de-campo do CSA e líder do grupo de baile LSD (Luz, Som e Dimensão). No Rio, começou gravando músicas de outros artistas para novelas da Globo – na trilha de ‘Gabriela’, cantou Caymmi; e no LP de ‘Fogo sobre Terra’, cantou Toquinho e Vinícius. Além disso, cantava na noite carioca – música brasileira, jazz, soul, o que pintasse. Mas depois do sucesso dos dois sambas citados, tudo mudou. Vieram, em incrível sequência, os LPs ‘Djavan’ (1978), ‘Alumbramento’ (1980) e ‘Seduzir’ (1981), com músicas como ‘Serrado’, ‘Álibi’, ‘Meu Bem Querer’, ‘A Rosa’ (com Chico Buarque), ‘Faltando um Pedaço’ e a própria ‘Seduzir’. O leque musical aumentara significativamente, passando a incluir baião, reggae, samba-canção, baladas, soul, e até um fantástico dueto com G.Gil (‘Humbiumbi / Nvula Leza Kia’) em nagô.

A partir disso, Djavan passou por altos e baixos criativos (mais altos do que baixos, é verdade); em 82, lançou o excelente ‘Luz’, mas caiu em seguida nos fracos ‘Lilás’’, ‘Meu Lado’ e ‘Não é Azul mas é Mar’. Alcançou novamente o sucesso popular com ‘Oceano’, em 1989, mas ficou marcado por muita gente como o ‘rei do virundum’, das letras incompreensíveis e até ridículas. Injustiça, injustiça: Djavan é um grande compositor, melodista de primeira e letrista muitas vezes inspiradíssimo (não se pode acertar sempre...). Não à toa, é um dos compositores brasileiros mais admirados e gravados por feras do jazz internacional. A prova disso está nos pouco comentados, porém superlativos discos que lançou entre 1992 e 98: ‘Coisa de Acender’, ‘Novena’, ‘Malásia’ e ‘Bicho Solto – o XIII’. Essa é, pra mim, a fase áurea do artista. Depois, parece que Djavan, mais uma vez, perdeu o rumo: partiu para a fórmula fácil do show “pra cantar junto”, enfileirando sucessos e engordando a conta bancária com o ultra bem-sucedido ‘Djavan Ao Vivo’. Competente mas muito fácil para um talento como Djavan. Preguiçoso, pode-se dizer. Houve uma certa redenção com disco de 2001, ‘Milagreiro’, mas a coisa ficou grave mesmo foi com o horroroso ‘Na pista, etc.’, um verdadeiro sacrilégio que reúne os sucessos do alagoano em versões ‘pra dançar’... ARGHHH!! O que foi isso, Dija??? Por conta disso, o disco mais recente, ‘Matizes’, de 2007, eu nem cheguei a escutar...

O show que vi ontem é bom, mas ‘bom’ é muito pouco para alguém como Djavan. Sua excelente forma física, aos quase 60 anos (que completa em 27 de janeiro), chega a ser inacreditável, mas a preguiça, a escolha do caminho mais fácil, continua. Em parte porque, há algum tempo, Djavan optou por colocar seus dois filhos na banda que o acompanha. Nada contra filhos, é lógico, mas não dá pra comparar o grupo atual com a espetacular banda Sururu de Capote, que acompanhava o artista em seus bons tempos. O público adora o show atual, é verdade, mas quem viu o banho de som que eram seus shows há cerca de 10 anos, se decepciona. É uma pena.
PS: As sofríveis fotos que ilustram esse post, foram tiradas no celular e são de minha autoria...